Reportagem da Revista Radis aborda a nova geração de estratégias para impedir a infecção pelo vírus HIV.
O mesmo mantra é repetido em campanhas desde o início da epidemia de aids: use camisinha. Mas o conhecimento nem sempre se traduziu em comportamento. Um exemplo: enquanto 94% dos brasileiros entre 15 e 64 anos concordavam que o preservativo era a melhor maneira de evitar a infecção pelo HIV, 45% não o adotaram em todas as relações sexuais casuais no período de um ano, segundo levantamento do Ministério da Saúde de 2013. Para superar os limites de uma forma única de prevenção, uma nova geração de estratégias que, combinadas, promete favorecer o controle de novos casos. Dentre elas, se destaca a PrEP, profilaxia pré-exposição, cuja incorporação ao SUS estava prevista para este 1º de dezembro, Dia Mundial de Luta contra a Aids, mas que acabou adiada por decisão do governo.
“A PrEP é uma grande esperança na prevenção da aids, especialmente para as pessoas que têm dificuldade com outros métodos, como a camisinha”, avalia o antropólogo Richard Parker, diretor-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia). A PrEP se soma ao preservativo e à PEP, profilaxia pós-exposição – que, apesar de estar disponível no SUS para casos de exposição ao risco via sexo consentido desde 2012, ainda impõe barreiras como discriminação e falta de informação para quem busca acesso. Essa gama de opções complementares forma o que se chama de prevenção combinada. “A prevenção é como uma caixinha de ferramentas. Quanto mais numerosas forem as possibilidades na caixinha, melhor, pois cada pessoa pode decidir o que é mais adequado para ela em determinado momento”, compara Parker.
PrEP: esperança adiada – A esperança tinha prazo: até o fim de 2016, segundo promessa feita pela diretora do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Adele Benzaken, durante a 21ª Conferência Internacional de Aids, em Durban (África do Sul), em julho. Mas a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), à qual caberia dar parecer favorável à adoção do método, decidiu em outubro aguardar aprovação do Truvada (nome comercial da combinação de tenofovir e entricitabina) para prevenção pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Atualmente, o medicamento está registrado apenas para tratamento (Radis 170).
“Queríamos dar essa boa notícia em 1º de dezembro, com o lançamento da PrEP no SUS, mas infelizmente a Conitec solicitou que aguardássemos a mudança de bula”, explicou à Radis a diretora Adele Benzaken, que disse ter pedido pessoalmente ao diretor-presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, a aceleração do processo. Segundo ela, Jarbas respondeu que iria “se empenhar nesse aspecto”. Como a Conitec entra em recesso nos meses de janeiro e fevereiro, a previsão agora é de que o protocolo de incorporação da PrEP ao SUS seja reapresentado em março.
Entre os especialistas ouvidos por Radis, avaliou-se que a Conitec poderia ter declarado interesse de saúde pública para o uso fora da bula (off-label) do Truvada — ou seja, o uso do medicamento para prevenção, apesar de estar aprovado pela Anvisa apenas para tratamento. O diretor-presidente da Abia questiona a vontade política do governo: “Há dois anos temos promessas dos diretores do Departamento de DST/aids, mas em um momento em que os princípios do SUS e da Constituição de 1988 estão ameaçados, com a PEC do Teto de Gastos, é incerto que haja esforço para adotar um método cujos custos são altos”.
Eficácia comprovada – Desde 2010 pesquisas vêm comprovando que o uso diário de um comprimido que combina os antirretrovirais tenofovir e emtricitabina é eficaz e seguro para proteger contra a infecção por HIV por via sexual. Entre homens que fazem sexo com homens e travestis, a eficácia pode chegar a 99% se a pessoa tomar a dose certa todo dia. Em 2014, a Organização Mundial da Saúde recomendou a profilaxia pré-exposição para pessoas em risco considerável de se infectarem com HIV. “É uma tecnologia com eficácia mais que constatada, para ser usada desde já”, pressiona Richard. Para ele, a PrEP deveria ser objeto de uma forte mobilização social, visto que é a grande novidade na prevenção de uma doença que tem 44 mil novos casos por ano no país.
Primeiro estudo demonstrativo no país, o PrEP Brasil avalia a aceitação, a viabilidade e a melhor forma de oferecer essa estratégia aos brasileiros, para embasar a decisão do Ministério da Saúde sobre sua incorporação. Coordenado pelo Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI), da Fundação Oswaldo Cruz, envolve 700 voluntários de Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e Manaus. Todos são acompanhados por equipe especializada de médicos, enfermeiros e psicólogos, têm acesso a aconselhamento para gerenciamento do risco de adquirir a infecção pelo HIV e passam por testes de HIV e de outras DSTs.
“Novas tecnologias podem ter impactos diferentes em cada contexto. É importante que a resposta para o SUS venha de dentro do nosso sistema de saúde, da nossa cultura, da nossa sociedade”, observa Valdilea Veloso, coordenadora do estudo. Os dados finais ainda não foram divulgados, mas a pesquisadora afirma à Radis que apontam, em todos os aspectos, para a relevância da oferta no país. “Estudos têm observado essa estratégia de diferentes posições, diria que quase em 360 graus, e até o momento essas perspectivas indicam unanimamente que a PrEP é viável e beneficia tanto a população-chave quanto a sociedade como um todo”.
Efeitos colaterais – O professor universário Wagner Araújo (nome fictício), de 36 anos, é participante de um dos estudos demonstrativos no Brasil. “Assim que vi um anúncio buscando voluntários, me inscrevi, porque sabia que, se funcionasse, seria muito importante para um mundo sem aids”, conta ele. A adaptação ao Truvada foi fácil, com poucos efeitos colaterais — gases, nos primeiros meses. O Iprex, primeira pesquisa a indicar a eficácia da profilaxia pré-exposição, concluiu que cerca de 16% dos usuários apresentaram algum tipo de efeito colateral. “É o que se chama de síndrome de início da profilaxia”, explica a coordenadora clínica do PrEP Brasil, Brenda Hoagland. “Náusea, enjoo, diarreia e gases são os sintomas mais comuns, mas tendem a desaparecer com menos de um mês de uso”. Segundo Brenda, a porcentagem de pessoas que relataram efeitos colaterais por aqui é “semelhante” — os dados oficiais ainda serão divulgados.
Para Wagner, o mais difícil mesmo foi se lembrar de tomar o medicamento diariamente. “Desenvolvi várias estratégias, botava alarme no celular, usava separador de comprimido que marca os dias da semana”, lista ele. Mesmo assim, em algumas ocasiões ele admite que se esqueceu do compromisso com a saúde. Enquanto testava a PrEP, Wagner diz não ter deixado de lado o sexo seguro: “Fiquei mais confiante de não me contaminar, mas nos aconselhamentos do estudo se martelava tanto a necessidade de se proteger que continuei a usar camisinha”.
Na conferência de Durban, a diretora do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais afirmou que, “no primeiro ano, a PrEP estará disponível para 10 mil pessoas”. Que pessoas? Adele Benzaken responde à Radis que o foco será nas populações com “alta vulnerabilidade, conforme recomenda o protocolo da Organização Mundial da Saúde”. O novo protocolo de HIV da OMS ao qual ela se refere afirma que a PrEP deve ser considerada pelos países, em suas políticas públicas, como alternativa de prevenção voltada a grupos com “risco substancial de infecção pelo HIV”. Cada um, de acordo com a forma como a epidemia se manifesta, define quais grupos estão em “risco substancial”. O Brasil considera como populações-chave homens que fazem sexo com homens, pessoas trans, gays, profissionais do sexo e pessoas que usam drogas.
PrPE pra quem? – Para participar do estudo PrEP Brasil, além de questões ligadas à orientação sexual, o candidato precisava preencher parte de uma série de critérios de comportamento sexual que favorecem a infecção: número de parcerias com sexo desprotegido, ocorrência de outras doenças sexualmente transmissíveis em um espaço de tempo e parceria identificada como soropositiva, entre outros. “PrEP não é para aquelas pessoas super preocupadas, paranoicas com prevenção, que usam camisinha, transam com um parceiro negativo, mas morrem de medo de se infectar”, exemplifica Valdilea. Do ponto de vista da boa aplicação do recurso público, diz ela, essas pessoas não são prioridade.
“A incorporação da profilaxia pré-exposição ao SUS só faz sentido, do ponto de vista do impacto na epidemia, se for para atingir as populações mais vulneráveis e diminuir as desigualdades de acesso ao cuidado com saúde”, argumenta. Pessoalmente, Valdilea afirma ser favorável à venda do Truvada (ou de um genérico) nas farmácias para aqueles que não se encaixam no conceito de população-chave, mas ressalta que é muito importante que a PrEP esteja disponível no SUS, sem custo, para as pessoas mais vulneráveis que assim desejarem, não só as mais pobres.
Richard Parker defende que a PrEP esteja disponível para quem quer: “Essa estratégia deveria estar disponível para todos que, com uma avaliação razoável, acham que é a forma de prevenção mais eficaz em determinado momento da vida”. A visão do diretor-presidente da Abia se baseia no conceito de “pedagogia da prevenção”, em que se oferece às pessoas as condições de decidir, dentre todas as opções preventivas, qual é a mais adequada. “O autoritarismo por parte dos especialistas é um dos causadores do fracasso da prevenção da aids. As pessoas não se comportam a partir da ordem dos outros, mas daquilo que elas consideram que é preciso”.
Custos X benefícios – De acordo com estimativa da Unitaid, agência ligada às Nações Unidas de financiamento em saúde, a combinação de medicamentos utilizada na PrEP poderá custar 100 dólares por usuário, anualmente, se aplicada em larga escala no Brasil. O INI também realizou estudo sobre a viabilidade econômica da profilaxia pré-exposição no país, comparando seus custos com as do tratamento de uma pessoa com HIV (que inclui exames, medicamentos e serviço de saúde pela vida inteira). “Concluímos que vale a pena, também do ponto de vista econômico, para o Ministério da Saúde incorporar a PrEP no pacote de prevenção combinada para a população-chave”, informa Valdilea.
Nos Estados Unidos, a PrEP já é oferecida, sob prescrição médica via seguros privados de saúde. “A profilaxia pré-exposição é hoje o carro chefe das estratégias de prevenção ao HIV por lá. Toda a esperança do programa americano de luta contra a aids está em cima dessa tecnologia”, observa Richard. O problema, segundo ele, é a exclusão de parte da população-chave: pessoas de comunidades mais pobres, marginalizadas, como jovens gays negros da periferia, têm dificuldade de acesso por não contarem com seguros de saúde. Outros países, como a França, tiveram incorporação limitada. “Se o Brasil adotar a PrEP nos próximos meses, será uma medida pioneira entre os países em desenvolvimento”, ressalta Valdilea.
Desinibição e DST – Uma preocupação comum é que os usuários deixem de usar a camisinha e, assim, tenham mais chance de contrair outras doenças sexualmente transmissíveis. O Brasil já registra uma epidemia de sífilis, doença infecciosa transmitida durante a relação sexual ou de mãe para filho, pelo sangue, durante a gravidez. Os casos saltaram de 1,2 mil para 65 mil em cinco anos e o principal motivo, segundo o ministério, é o sexo desprotegido, principalmente entre jovens e adolescentes.
“Devemos levar em conta que a PrEP é uma estratégia para quem já tem dificuldades com o preservativo. Não se trata de trocar o preservativo pelo medicamento da PrEP, e sim de oferecer proteção aos que não têm nenhum tipo de proteção”, argumenta Brenda. Nenhum estudo detectou aumento de outras DSTs, segundo a coordenadora clínica do PrEP Brasil, que credita o dado ao fato de o medicamento estar necessariamente associado à orientação profissional.
Para receber os comprimidos, os voluntários das pesquisas passam por testagem para HIV e hepatite B e sessões de aconselhamento. A assistente de pesquisa da Fiocruz Biancka Fernandes, voluntária do PrEP Brasil, relata que se cuida mais desde que começou a tomar o comprimido todo dia. “As mulheres transexuais têm muita dificuldade de acessar o sistema de saúde, porque é comum sofrer preconceito. Com esse acesso restrito ao serviço, muitas vezes falta conhecimento de onde o risco é maior e de todas as estratégias de prevenção”, diz.
Valdilea reforça que, quando adotada, a PrEP não deve ser uma intervenção isolada, mas parte da prevenção combinada. “A pessoa que se candidata a usar o medicamento vai ter acesso a testagem frequente, lubrificante, preservativo, vacinação contra hepatite B, acesso a uma equipe que vai conversar para entender sua vulnerabilidade e orientar sobre as formas de superá-la”.
Outra preocupação quando se fala de PrEP é com a “desinibição” dos usuários, que passariam a fazer mais sexo, com um maior número de parceiros. Nenhuma pesquisa identificou esse fenômeno. “Nos EUA chegou-se a criar a expressão ‘prostitutas da PrEP’, mas este julgamento moral é uma cortina de fumaça para encobrir as evidências científicas”, acredita Richard. Para ele, a visão de que se estaria bancando o prazer alheio é fruto de discriminação e estigma ainda associados ao HIV. “Existe uma corrente de pensamento que ainda culpa as pessoas vivendo com HIV, por seus ‘atos não pensados’ ou seu ‘comportamento de risco’, mas a prevenção também é um direito fundamental das pessoas digno do investimento público”.
PEP: direito desconhecido
A PEP, sigla em inglês para profilaxia pós-exposição, está disponível no SUS desde 2010 para os casos de relação sexual de risco desprotegida, mas grande parte dos brasileiros (e mesmo dos profissionais de saúde) não conhece essa estratégia. “As pessoas chegam aqui procurando esse serviço depois de terem passado por duas ou três unidades em que tiveram seu direito negado”, conta Valdilea Veloso, chefe substituta do Laboratório de Pesquisa Clínica em DST e HIV/aids do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz). “Somente as que detêm mais conhecimento conseguem efetivamente ter acesso à PEP. As outras vão desistir no caminho”, corrobora a coordenadora clínica do PrEP Brasil, Brenda Hoagland.
Os medicamentos para barrar a infecção após a exposição sexual ocasional de risco são preferencialmente distribuídos nos CTAs, centros de testagem e aconselhamento especializados em doenças sexualmente transmissíveis. “Esses CTAs fecham nos fins de semana, e a pessoa que procura o PEP nesse período em outras unidades de saúde tem dificuldade de conseguir encontrar uma em que seja acolhida”, observa o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Sao Paulo (USP), Mário Scheffer.
Corrida contra o relógio – O percurso em si já é uma corrida contra o relógio: o ideal é que os medicamentos sejam ministrados nas primeiras duas horas após a exposição ao risco; o protocolo do Ministério da Saúde indica o prazo de 72 horas como limite. “É um momento de angústia, não gosto nem de lembrar. Você sabe que está correndo risco e só quer tentar consertar”, relata uma pessoa que conseguiu acesso. São comuns os relatos de julgamento moral por parte dos profissionais de saúde, com frases como “Quem mandou fazer besteira?” ou “Você que procurou isso”.
“O protocolo clínico de profilaxia antirretroviral pós-exposição de risco para infecção pelo HIV foi atualizado em 2015 e simplificou os procedimentos para facilitar o acesso nos serviços de saúde”, informa a diretora do Departamento de DST/aids, Adele Benzaken. O documento deixa de fazer distinção entre os três tipos de PEP existentes — acidente ocupacional, violência sexual e relação sexual consentida.
Além disso, o departamento criou um aplicativo, o “PEP”, que tira dúvidas sobre a estratégia e indica onde procurar atendimento. O app é inspirado em outros dois desenvolvidos pela prefeitura de São Paulo: o PEPtec é voltado a auxiliar profissionais de saúde no atendimento de pacientes que passaram por situações com potencial risco de infecção pelo vírus; o Tá na Mão tem informações sobre prevenção ao HIV, uma calculadora de risco de infecção e uma busca por GPS dos endereços mais próximos onde a pessoa pode buscar esse tratamento.
Até maio deste ano, 12.611 brasileiros tiveram acesso aos medicamentos após exposição sexual, segundo o ministério. São 28 dias consecutivos de uso dos antirretrovirais tenofovir, lamivudina e atazanavir/ritonavir. Estudos indicaram baixas proporções de pessoas que completaram o curso completo de PEP. As taxas de abandono são especialmente altas entre adolescentes e também entre aqueles que sofreram violência sexual.
PROFILAXIA PÓS-EXPOSIÇÃO (PEP)
A PEP é a utilização da medicação antirretroviral após qualquer situação em que exista o risco de contato com o vírus HIV. A medicação age impedindo que o vírus se estabeleça no organismo, por isso a importância de se iniciar esta profilaxia o mais rápido possível após o contato. A recomendação é em até 72 horas, sendo o tratamento mais eficaz se iniciado nas duas primeiras horas após a exposição.
Há indicação para as pessoas que podem ter tido contato com o vírus por violência sexual, relação sexual de risco desprotegida (sem o uso de camisinha ou com rompimento da camisinha) ou acidente ocupacional (com instrumentos pérfuro-cortantes ou em contato direto com material biológico).
O tratamento deve ser seguido por 28 dias. Geralmente, consiste em uma pílula diária, mas pode ser preciso tomar mais de um medicamento por dia. Os efeitos colaterais mais comuns são dor de cabeça, enjoos e diarreia.
(Fontes: Unaids, PrEP Brasil e Ministério da Saúde)
TRATAMENTO COMO PREVENÇÃO (TASP)
O uso de medicamentos antirretrovirais faz com que as pessoas vivendo com HIV/aids alcancem a chamada “carga viral indetectável”. Além de ganharem uma melhora significativa na qualidade de vida, elas passam a ter uma chance muito menor de transmitir o vírus a outra pessoa. Estudo que deve ser concluído em 2017 já indicou que nenhum voluntário com carga viral indetectável — gay ou heterossexual — transmitiu o HIV ao parceiro sorodiscordante em um período de dois anos de análise.
No Brasil, todas as pessoas vivendo com HIV/aids têm direito ao tratamento com os antirretrovirais. Os medicamentos utilizados atualmente apresentam menos efeitos colaterais quando comparados com aqueles utilizados no início da epidemia.
(Fonte: Unaids e Ministério da Saúde)
Brasil perto da meta
O Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (Unaids) estabeleceu, em 2014, três metas para acelerar a eliminação da epidemia de aids: 90% de todas as pessoas vivendo com HIV devem saber que têm o vírus, 90% de todas as pessoas com infecção pelo HIV diagnosticada devem receber terapia antirretroviral ininterruptamente e 90% de todas as pessoas recebendo terapia antirretroviral devem ter supressão viral. O prazo final é 2020.
“Estamos muito bem no que diz respeito ao diagnóstico e à carga viral indetectável, entretanto há ainda uma brecha no tratamento”, revela a diretora do Departamento de DST/aids, Adele Benzaken. Segundo dados da pasta, em 2015, do total de 830.000 pessoas vivendo com HIV, 87% já haviam sido diagnosticadas; deste número, 64% estavam em tratamento para o HIV; e, das pessoas em tratamento, cerca de 90% apresentavam carga viral indetectável.
O relatório que analisa o progresso global rumo ao cumprimento das metas 90-90-90 lançado pelo Unaids durante a 21ª Conferência Internacional de Aids cita o Brasil como exemplo de que os objetivos podem ser alcançados. Desde 2013, o SUS oferece antirretrovirais para todos os portadores de HIV, independentemente do estágio da doença — até então apenas França e Estados Unidos distribuíam os medicamentos para pacientes ainda sem comprometimento do sistema imunológico.
A Organização Mundial da Saúde recomendou ano passado que em todos os países as 37 milhões de pessoas que têm HIV devem ser postas imediatamente em tratamento antirretroviral. A terapia antirretroviral padrão consiste na combinação de fármacos antirretrovirais para suprimir o vírus HIV e parar a progressão da aids.
“Quanto mais precocemente uma pessoa inicia o tratamento, mais prolongada será sua vida”, ressalta Adele. Evidências demonstram que o tratamento iniciado mais cedo leva a uma melhor evolução da doença a médio e longo prazo, com menos complicações, menos infecções oportunistas e maior expectativa de vida, se comparadas com pessoas que começaram a se tratar tardiamente. Além disso, pessoas vivendo com HIV/aids em tratamento podem alcançar a carga viral indetectável e, assim, passam a ter uma chance muito menor de transmitir o vírus.
A epidemia no Brasil – Em 2014, a prevalência de HIV estimada para o Brasil em relatório do Unaids era de 0,4% a 0,7% em pessoas de 15 a 49 anos. Entre homens gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH), essa prevalência sobe para 10,5% — segundo o Boletim Epidemiológico de HIV/aids de 2015. O boletim indicou que há uma tendência de aumento na proporção de casos de aids em HSH nos últimos dez anos.
Também foi notado o crescimento do número de casos na juventude (entre 15 e 24 anos). De 2005 a 2014, a taxa de detecção de aids entre brasileiros com 15 a 19 anos mais que triplicou (de 2,1 para 6,7 casos por 100 mil habitantes) e entre brasileiros de 20 a 24 anos, quase dobrou (de 16,0 para 30,3 casos por 100 mil habitantes). Outras populações vulneráveis são as que usam drogas e os profissionais do sexo.
O país tem uma das maiores coberturas de tratamento antirretroviral entre os de baixa e média renda, com mais da metade (64%) das pessoas vivendo com HIV sendo tratadas. A média global em 2015 foi de 46%, de acordo com dados compilados pelo Unaids.